quarta-feira, 15 de agosto de 2007

O mundo de Fellipe - Segunda Premissa

...de volta ao mundo de Fellipe silva e silva (ou Santiago) onde tuuuudoooo pode acontecer!

como eu citei na postagem anterior, vou postar minha primeira crônica aqui no blog.

enjoy!

Parei de Fumar! (ou não)

Parei de fumar. Definitivamente. Preciso só acender um cigarro para me acostumar definitivamente com a idéia. Também não dá para parar de fumar, assim, sem fumar nem um cigarro antes. E outro depois. Outro depois nada. Só vou fumar mais este e acabou-se. O último cigarro da minha vida. Nunca mais haverá outro. Nunca mais, juro pela minha dignidade, pegarei da mesa, com a mão esquerda, o maço reluzente. Nunca mais abrirei, com a mão direita, a deslizante tampa "flip open box". Never more as palavras "premium blend" escritas em fina tipologia dourada. Nunca mais olharei os cigarros enfileirados, por um instante, à procura daquele que parece mais atraente. Nunca mais tirarei o escolhido do maço, usando o polegar, o indicador e o dedo médio da mão direita, fazendo-o escorregar pelo fino papel laminado como um seixo escorregando docemente pelo leito caudaloso de um rio. Lá venho eu com poesia barata só para causar comoção. Comportamento típico de quem quer se fazer de vítima. Até porque eu nunca vi um seixo escorregando docemente pelo leito caudaloso de um rio e, mesmo que tivesse visto, não ligaria a mínima para ele, a não ser que pudesse fumá-lo. Volto ao meu último cigarro. Primeiro o acariciarei suavemente, então tomarei na palma da mão o isqueiro, cadê o isqueiro?, perdi, deve estar atrás do sofá, não está, haverá algum lugar para onde vão os isqueiros perdidos?, embaixo da almofada?, achei, atenção, é agora. O dispositivo acionado libera o gás com um quase inaudível click, a chama se acende, e eis que chega o começo do fim. O primeiro trago no último cigarro da minha vida. Por que não descobrem que brócolis faz mal e cigarro faz bem? Provavelmente porque brócolis faz bem e cigarro faz mal. Assim que eu acabar esse cigarro, vou correndo comer brócolis. Mas antes vou aproveitar cada tragada. O ritual do último cigarro é tão triste que deveria apagar os pecados do fumante, junto com as manchas nos seus pulmões, tornando o novo ex-fumante uma pessoa digna desta vida, até que ele viesse a morrer atropelado, ou de bala perdida, qualquer morte que nada tivesse a ver com o seu torpe passado. Moribundo ainda, enquanto a foice da malvada começasse a ceifar sua saudável existência, o ex-fumante comemoraria orgulhosamente: morri, sim, mas de cigarro é que não foi! Mais um trago e o papel vai virando cinza, anunciando de uma vez só duas tragédias. Primeira: estes 7 ou 8 centímetros fumados já estão devidamente instalados nos meus bronquíolos, lesando-os destrutivamente. Segunda: o cigarro já está quase no meio. A rubra brasa pede, aflita, "me fume logo", e eu obedeço, sucumbindo aos poderes do mal. Um trago mais profundo e me despeço do maço prestes a ser abandonado. "Não existem níveis seguros para o consumo destas substâncias." E haverá, ó Deus, níveis seguros para viver, com ou sem cigarro, neste mundo cruel e violento? Agora eu já comecei a fazer drama demais. Deus não tem nada a ver com isso. A conversa aqui é entre mim, os meus pulmões e o meu maço prestes a ser abandonado. Se Deus quisesse que o homem fumasse teria criado uma árvore que daria cigarros, como outras dão maçãs. Se bem que o tabaco é uma erva, e não foi Deus quem criou as ervas? Criou. Que seja. Mas Ele não mandou ninguém arrancar as ervas e enrolar em papel cheio de pólvora para estourar a saúde da humanidade. E além do mais está escrito aqui: "Este produto contém 4.700 substâncias tóxicas e nicotina, que causam dependência física e psíquica", e não foi Deus quem criou as substâncias tóxicas. E, se tivesse criado, elas não seriam 4.700 exatamente, pois Deus tem mais o que fazer do que ficar contando substância tóxica até chegar a um número tão redondo. O último trago. Adeus. Acabo de virar uma ex-fumante. E prometo, como tal, execrar o abominável vício. Farei campanhas antitabagistas. Participarei da Corrida de São Silvestre carregando bandeiras, se bem que se eu carregar bandeiras, com o pouco fôlego que tenho, chegarei em último lugar, se não morrer asfixiado no meio do caminho. Essa hipótese de morrer asfixiado já me deixou sem ar. Preciso urgentemente de um cigarro. Só mais um. Não vai ser um único cigarro que vai causar a minha morte. Um único cigarro também não é o fim do mundo. Os franceses, por exemplo, fumam muito, e Paris não se acabou por causa disso. Mas se acabará, meu caro. Pouco a pouco. Paris não se acaba em um dia, e o cigarro mata lentamente. Vai destruindo a pleura pulmonar, obstruindo as artérias, aumentando o volume dos espaços aéreos distais até que o enfisema se instale, ou, pior ainda, o câncer pulmonar, ou, quem sabe, um infarto agudo no miocárdio. Agora fiquei mais nervoso ainda. Vou fumar só mais este e então, juro pela minha dignidade, pararei definitivamente. Não seria ótimo parar de fumar definitivamente podendo fumar um cigarro atrás do outro para compensar a carência? Afinal, sem um cigarrinho tudo fica muito mais difícil. Parar de fumar, inclusive.

Jonas Fellipe.


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i'm not your monkey!

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